A Gugu, a Pedagogia e o Poder da Aprendizagem

“Olá, sou eu. Queria falar contigo”

Uma mensagem do WhatsApp que parece banal, mas não é.

Tenho uma tia-avó com 91 anos e glaucoma, praticamente invisual. Deixou de atender o telefone porque não vê os botões. Também não consegue telefonar a ninguém. Passa grande parte do dia sozinha. Tem uma memória incrível e uma personalidade encantadora. Recordo-me desde sempre do seu sorriso fácil e do seu abraço apertado.

Depois da comemoração dos 91 anos e da perceção dos seus desafios de comunicação, convidei-a para passar uma semana comigo e trabalharmos numa solução. Preparei a chegada com semanas de antecedência, um telemóvel específico, testei dezenas de apps de acessibilidade e acabei por avançar com o Gemini.

Fui buscá-la e começou a nossa aventura. Pensei que ia conseguir manter o ritmo de trabalho habitual, mas rapidamente percebi que não. Tudo certo. Adaptei-me. E ainda bem. Ouvi histórias da minha mãe, da minha avó. A memória impecável. As partilhas sentidas. A vulnerabilidade partilhada.

O plano era treinar um bocadinho todos os dias com tranquilidade. Primeiro dia, primeiro obstáculo: dizer “Hey Google” rápido parece fácil, mas não é, de todo. Desesperada, fui ao Reddit e encontrei a solução “Gugu também dá”. Resultou. Temos Gugu!

Assim foi. Primeiro, pedidos simples: “Hey Gugu, que horas são?” “Hey Gugu, que dia é hoje?”. Depois fazer chamadas, enviar mensagens e ouvir mensagens recebidas. A Gugu só não atende chamadas (ainda) mas demos a volta decorando o sítio onde aparece “o verdinho”.

No fim da semana levei-a de volta a casa. Chorámos as duas no abraço de despedida. No dia seguinte, recebi uma mensagem escrita do telefone dela. Uma pessoa praticamente invisual de 91 anos, que tinha experimentado o sistema pela primeira vez uns dias antes, enviou-me sozinha uma mensagem escrita com comandos de voz. Absolutamente incrível. Liguei-lhe: “Tia conseguiu!!!” ela respondeu “Foi a GUGU”. Não, não foi a Gugu. Foi a tia.

A tecnologia foi importante, sim, mas o que fez a diferença foi o poder da aprendizagem e da confiança. Os nossos pequenos momentos de prática, num espaço seguro, aberto ao erro e cheio de entusiasmo mútuo, transformaram-se em autonomia. Hoje a minha tia fala, envia mensagens e comunica com a família que vive no estrangeiro. A confiança e a alegria de aprender foram, e sempre serão, maiores do que a tecnologia em si.

Do meu lado, só apresentei a Gugu a alguém desejoso de aprender e desenhei situações de aprendizagem que permitiram usar essa tecnologia, acompanhando o processo com a absoluta confiança que íamos conseguir. Foi bom voltar à base, ser facilitadora de aprendizagens, um canal não de transmissão de conteúdos e sim um veículo de entusiasmo, confiança e novas competências partilhadas.

No fim de tudo, aprendi bem mais que a minha tia. Reforcei a ideia de que a Inteligência Artificial no ensino é um veículo extraordinário, capaz de inspirar docentes e estudantes a reinventar a sala de aula e torná-la ainda mais mágica. Reforcei a ideia de que quando acreditamos que alguém é capaz de alguma coisa, isso transmite-se com tal força, que a outra pessoa também passa a acreditar nisso. E, acima de tudo, relembrei-me de como o carinho nos ajuda a fazer tudo com calma, a respeitar o espaço do erro como um passo no processo e celebrar entusiasticamente cada conquista.

O desejo? Que esta essência me acompanhe ao longo de todo o ano letivo. E, se lhe fizer sentido, que esta partilha seja também um convite para si: parar, refletir e inspirar-se na sua própria essência pedagógica.

Um beijinho e um magnífico início de setembro!
Sofia